Sunday, August 22, 2010

Mosca Azul

Lula já cumpriu sua missão com relativo sucesso. Sem formação escolar adequada e tampouco conhecimento suficiente para entender e exercer bem seu papel de chefe de governo e de Estado do Brasil, Lula deixará o cargo de Presidente com aprovação popular a sua pessoa e a seu governo extraordinariamente alta. Da elite brasileira, obterá o reconhecimento de que preservou a economia de mercado funcionando normalmente e acima de tudo, com inflação controlada. Seu diálogo fácil e paternalista com nossa sofrida população pobre e simples e com setores radicais de esquerda permitiu-lhe manter clima de respeito às instituições democráticas durante seu governo. O apadrinhamento de lideranças sindicais poupou-lhe de manifestações públicas do contra, tão comuns em governos anteriores, particularmente no de FHC, dificultando a adoção de reformas e medidas necessárias ao desenvolvimento sustentável do Brasil, até hoje postergadas. Somente para lembrar aos jovens, durante mais de meio século, o bordão FORA FMI animava a gritaria em manifestações populares contra o governo federal patrocinadas pelos sindicatos. Lula exterminou-o ao manifestar seu desejo de ampliar o capital do Brasil no FMI para ter mais votos em sua diretoria. Ele explorou politicamente o fato de haver diminuição na desigualdade de distribuição de renda, esta ainda superior a de países vizinhos, porém sem avançar na igualdade de oportunidade por deficiência nos serviços públicos oferecidos à população de baixa renda. Lula manteve o País afastado dos radicais do PT e de suas propostas expropriadoras que pudessem enfraquecer nosso já débil estado democrático de direito. Infelizmente, como homem do povo sofrido não conseguiu entender que o caminho definitivo de saída da pobreza e da própria miséria, sem negar ajuda emergencial necessária para sua sobrevivência, passa necessariamente pela sala de Educação. Com “E” maiúsculo por envolver não só conhecimento técnico, mas o desenvolvimento de valores e cultura, como o de amor e respeito a sua própria vida e à do próximo, bem como de valores éticos e morais que se traduzam em hábitos e costumes civilizados. Perdeu-se muito tempo na discussão de políticas afirmativas para descendentes de negros e índios, como a de quotas para ingresso nas universidades, gerando tensões desnecessárias e abalando princípios básicos de igualdade e mérito que devem nortear os processos de seleção e promoção nesse nível de educação. Lula deu menos importância política à educação fundamental e profissionalizante, jactando-se do grande número de universidades criadas por seu governo. Com essa escolha, ele colocou a população pobre em situação paradoxal de não conseguir preencher vagas abertas pelo desenvolvimento do País por falta de educação básica e profissionalizante, enquanto egressos de cursos universitários pouco concorridos e de pouca demanda no mercado de trabalho ficam desempregados. Na realidade, a discriminação mais ampla em nosso País é contra a pobreza que não teve acesso à educação fundamental de qualidade, tampouco conhecimentos suficientes para o exercício de profissões mais bem remuneradas no mercado de trabalho. As entidades públicas e privadas não se importam com a origem dos pobres e os matizes de cor de sua pele na contratação de empregados. Elas levam em conta somente sua educação e competência, avaliadas rigorosamente em concorridos processos de recrutamento e seleção, dando-se preferência aos egressos de cursos embasados nas chamadas ciências exatas. A eventual discriminação a descendentes de africanos, apesar da maioria do povo brasileiro ter-se integrado à população negra e de outras origens definitivamente e existirem leis que penalizem os que ainda pensam poder praticar discriminação em nosso País, deve ser combatida com rigor. Fiscalização ostensiva e efetiva, bem como rápido julgamento e punição dos culpados é a resposta correta a esse problema. Isto posto, é surpreendente o que se tem observado no atual processo eleitoral depois de Lula ter demonstrado sua maturidade política ao não agredir nossas instituições democráticas com a disputa por um terceiro mandato, o que provavelmente aconteceria se usasse e abusasse da popularidade alcançada em seu governo. Contudo, escolheu discricionariamente Dilma como sua sucessora, desrespeitando o procedimento de escolha de candidatos a cargos eletivos adotado pelo PT, considerado como o mais avançado e democrático entre os grandes partidos políticos brasileiros. Muitos dos pretendentes, bem mais experientes e qualificados que Dilma, calaram-se diante do fato consumado. Em relação à vaga de vice na chapa de Dilma, Lula chegou a interferir no processo de seleção do PMDB. E nos demais partidos da coligação em candidaturas para governador e para membros do congresso nacional a fim de viabilizar a campanha de sua candidata em todos os estados do País. É possível que o desejo de serem contagiados pelo vírus da popularidade de Lula, associado à falta de comunhão de idéias e propostas nos conglomerados humanos conhecidos como partidos políticos, os tenham transformado em peças dependentes da vontade soberana de Lula. Em outras palavras, o desejo de se manter no poder, transforma nossos políticos, seja em Lulistas, ou simplesmente simpáticos à Lula, mas jamais anti-Lula. O foco da independência de poderes que deveria estar no Congresso se deslocou paradoxalmente para a Justiça cujos membros da mais alta corte são indicados pelo Presidente. Lula também atropelou a lei eleitoral e se empenhou na promoção política de Dilma para Presidenta antes do tempo legalmente permitido, colocando em situação ridícula os tribunais eleitorais. Mais recentemente, transformou sua posição de Presidente em mero cargo de funcionário público, outorgando-se o direito de nas horas “fora do expediente” dedicar-se plenamente à campanha de Dilma, comportando-se como cabo eleitoral itinerante. Ao fazer isso, deixa sua função de presidente de todos brasileiros, participando e se tornando o principal protagonista em manifestações públicas populares. Sua energia e disposição em eleger Dilma dão a impressão que busca realizar o desejo oculto de conseguir um terceiro mandato para o Lulismo e não a eleição da candidata de seu partido e da coligação partidária reunida em torno de seu nome. E mais do que isso. Garantir a si próprio presença ativa no próximo governo, dada a fragilidade política de sua candidata, até o início desta década desconhecida no meio político nacional e da população brasileira fora do Rio Grande do Sul. Sua biografia não a qualifica para disputar a presidência do Brasil. Ao concluir nove anos de educação no tradicional colégio de freiras SION, com dezesseis anos recém completados, matriculou-se em escola pública no primeiro ano de ensino médio. Namorou e depois casou com o comunista Carlos Galeno Magalhães Linhares que a atraiu para os movimentos revolucionários da época, inspirados no pensamento marxista-leninista e na vitoriosa revolução cubana. Dilma seguiu os passos de Linhares, deixando-o em 1.970, com pouco mais de vinte anos de idade, para se tornar companheira de outro líder revolucionário, Carlos Franklin de Araújo, tendo participado do grupo VAR-Palmares responsável por assaltos e assassinatos. Foi presa e torturada. Mais tarde, sob a influência de Araújo, um dos fundadores do PDT, e influente político no Rio Grande do Sul, ela ocupou o cargo de Secretária de Energia nos Governos de Alceu Collares (PDT) e de Olívio Dutra (PT), tendo nesse último se filiado ao PT para se manter no cargo após o rompimento da aliança PT-PDT. Finalmente, já afastada de seu segundo companheiro, pai de sua única filha, Dilma participou do grupo de apoio à eleição de Lula, em 2.002, e ocupou o cargo de Ministra de Energia do governo eleito. E, em 2.005, substituiu José Dirceu como Ministra-Chefe da Casa Civil. Com mudanças radicais em sua aparência física e treinada para se comunicar com o povo, ainda assim, Dilma continua sendo uma técnica, ou tecnocrata, como eram chamados os técnicos durante a ditadura militar. É estranha no ninho político tradicional e inexperiente em disputas eleitorais, pois a presidência será o primeiro cargo eletivo postulado por ela. Em suma, necessitará e terá Lula a seu lado, antes e depois das eleições, se for eleita. Não é por acaso que em discurso recente Lula advertiu o eleitor que ao não encontrar seu nome entre os candidatos a Presidente deve escolher o de Dilma, porque “ela é ele”. E que Dilma será a garantia da continuidade de seu governo. Ela será a mãe do povo brasileiro. Isso tudo nos traz à lembrança Perón, na Argentina; primeiro com Evita, que o Vaticano negou-se a santificar, e depois Isabelita. Ou, na recente versão “light”, o casal Kirchner. Será que vamos passar por isso também? Tudo indica que sim. Não tenho mais dúvida que Lula foi mordido pela mosca azul cujo efeito de longo prazo somente terminará quando o povo brasileiro for mais bem educado e houver menos desigualdade econômica, social e cultural em nosso País. Vamos votar e não esmorecer em nosso trabalho para que isso aconteça em ambiente de liberdade e dentro do quadro político-institucional de Estado Democrático de Direito em que vivemos, independente do resultado das urnas. Capitalismo de Estado e Socialismo não fazem parte de nossas opções políticas em votação, devendo eventuais passos nessa direção depois das eleições serem firmemente rejeitados.

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