Prezados leitores, trata-se de artigo não aceito para publicação na Folha na época em que o escrevi. Resolvi divulgá-lo, novamente, em meu modesto BLOG, tendo em vista o que acontece hoje. E também pelo fato do Presidente Bolsonaro, em manifestação pública se vangloriar do Brasil ter sido o País que melhor enfrentou a pandemia e que, agora (dia 12/12/2020), "estamos no finalzinho"(sic).
Quarentena - Sim ou Não E. J. Daros*
Infelizmente, políticos adeptos
da velha filosofia religiosa maniqueísta continuam ocupando o poder e conseguem
tumultuar o trabalho de profissionais que lutam na defesa de nossa saúde
ameaçada pelo COVID-19 com a falsa opção: SIM ou NÃO, referindo-se à
quarentena.
A velocidade de contaminação
deste novo coronavirus é tal que extrapola os recursos hospitalares disponíveis
para tratamento. O que nos chama a atenção, porém, é que a luta contra o novo coronavírus
em nosso País está concentrada somente em
setores de saúde das três esferas de governo, coordenada pelo médico
ortopedista e ex-deputado federal, Luiz Mandetta, atualmente Ministro da Saúde.
A reduzida participação de outros
setores que dispõem de experiência e conhecimento para colaborar na redução dos
custos dessa luta é incrível. O mínimo que nós esperamos agora do governo é
eficácia e eficiência no combate da epidemia de que somos vítimas. Basta-nos
lembrar da frustração generalizada da população brasileira com o desempenho de
nossa economia e do alto nível de desemprego prevalecente em nosso País,
justamente no início dessa pandemia. O mínimo que nós esperamos agora do
governo é eficácia e eficiência no combate da epidemia de que somos vítimas. O
lema infantil de pessoas alienadas que “não há custo que não possa ser pago por uma
vida salva” é de uma estultice que não merece comentário. Portanto, buscar integrar
atividades de outros setores visando reduzir custos e garantir empregos, sem prejuízo de acabar com
a epidemia, é sim, prioritário.
Amenizar os efeitos negativos
na economia e no emprego, já afetados seriamente nos últimos anos, é um
objetivo secundário, porém muito importante e prioritário nas circunstâncias em
que nos encontramos. Pensando nisso, ficamos impressionados achar-se que a
mobilidade em espaços públicos urbanos, forte geradora de contaminação e
determinante em justificar a quarentena de alto custo econômico e social, seja
somente assunto de medicina.
Um exemplo típico de ineficácia é a
ausência de fiscalização do respeito às regras impostas pela própria
quarentena; na India se utiliza o chicote; na Europa, multa-se e prende-se; e,
no Brasil, filmam-se os desobedientes. A prisão domiciliar preventiva se
ajustaria perfeitamente aos nossos infratores.
O direito de ir e vir nesse
caso é cerceado, sem dúvida. Porém, sem prejuízo do direito de sair por pouco
tempo para comprar produtos e serviços essenciais à sobrevivência, Se for vetada
pela justiça por se tratar de cláusula pétrea de nossa Constituição,
pergunta-se como se enquadraria o alto risco da contaminação pelo vírus
causador de mortes evitáveis? Aonde iria o morto exercer seu direito
constitucional de ir e vir?
Com relação ao pequeno comércio
ou lojas e consultórios de prestação de serviços com no máximo 3-4 empregados
trazidos de casa e levados depois em transporte particular, ou abrigados no
próprio estabelecimento, desde que funcionem de porta fechada com horários
marcados para seus clientes, é medida que poderia e pode reduzir o impacto
negativo sem risco para a quarentena já numa primeira fase de relaxamento em
áreas e setores específicos. Trata-se, porém, de proposta a ser avaliada quando
se iniciar a redução do isolamento.
Os brasileiros, que não conseguem entender
a importância da quarentena que envolve matemática, estatística e avaliação de
cenários de probabilidade de resultados, estressados pelo desemprego e perdas
de toda ordem dela decorrentes, dividiram-se em vários grupos: os que não
gostam da quarentena, mas têm consciência que sem sucesso dela estaremos repetindo
o ciclo desesperador da Itália, e por isso a toleram; restam ainda os que nunca
a aceitaram e continuam circulando nas vias públicas a pé e de automóvel, por
interesses e razões diversas; e, finalmente, o grupo político que imita o
Presidente que a desrespeita em suas andanças em Brasília.
Os que respeitam a
quarentena seguem as normas do Ministério da Saúde, acolhidas pelo Presidente
(sic), pelas demais instituições brasileiras envolvidas legalmente nela e pela
Organização Mundial de Saúde.
É
surpreendente, também, o silêncio que prevalece em relação à possibilidade de
se produzirem no Brasil máscaras, luvas, aparelhos de teste, respiradores,
desinfetantes gerais, álcool-70 e outros produtos essenciais de uso hospitalar,
seja para reduzir preços e especulações, ou para evitar custos e atrasos
frequentes nas importações. Não se tem notícias sobre entidades de saúde, da
indústria e engenharia de produção e de centros de pesquisas de universidades, dialogando
e avaliando juntos as possibilidades de sua produção. É possível que melhor
coordenação e integração desses setores resultem em produção nacional desses
instrumentos e produtos.
Lemos
notícias recentes, por exemplo, que uma unidade “Startup” em Curitiba vai
produzir testadores; e que pesquisa realizada na Escola Politécnica da USP já
possui um protótipo de respirador.
A situação de doentes morrerem por falta de respiradores ou o número de
contaminados aumentar por ausência de fiscalização da quarentena, de testadores
indispensáveis para monitorar e internar contaminados, são exemplos de
situações inaceitáveis. Pior ainda, médicos, enfermeiros, enfermeiras, e demais
pessoas que estão na frente da batalha em contato direto com os contaminados,
sem a proteção adequada, correndo o risco de se contaminar e até mesmo falecer.
O
objetivo da quarentena não é o de eliminar o coronavirus do rol de nossas
doenças, transmissíveis ou não. Assim, como em outras doenças viróticas, o
objetivo almejado é de termos uma vacina que proporcione a nosso sistema de
imunização o poder de neutralizá-lo. Quem tem filhos se lembra de eventos que
ampliaram o uso de vacinas desenvolvidas para preservarem sua saúde e a própria
vida. Contudo, o atraso cultural, responsável por usos e costumes saudáveis, associado
à falta de educação, particularmente sobre nosso corpo e suas características
funcionais, têm-nos levado a situações incríveis, tais como: abandonar a vacinação
porque ninguém mais tem sarampo; tomar injeção de antibiótico de largo espectro
para combater gripe; utilizar remédio receitado para certa doença para curar
outra, sem falar no recurso à nossa vegetação utilizada para tratamento de
doenças sem base científica. A situação hoje é diferente em relação ao novo coronavirus?
Todos estamos conscientes dos riscos que
corremos se contagiados? Ouvi,
recentemente, que já existe solução para a pandemia que ainda não foi adotada
por razões políticas! É uma fantasia inimaginável que demonstra claramente
nosso baixo nível sociocultural e sonhador que ainda domina nossas mentes
ignorantes, principalmente quando nosso Presidente defende o uso de medicamento
existente para uso em outras doenças e rejeitado cientificamente para tratamento do
coronavirus.
FIM